Paraibagens

Ao dia ou à noite, quase diariamente, num turno ou no outro, deparo-me com as seguintes questões fundamentais: cuscuz, macaxeira, tapioca ou inhame? Queijo coalho, ovo ou carne de sol? Nesse universo, combino alguns elementos e componho o café-da-manhã ou jantar de guerra que manterá esta moçoila em pé. Tudo sem glúten, já na vanguarda do modismo nutricional do momento.

Sou da penúltima geração remanescente que ainda chama pai e mãe de “painho” e “mainha”, um regionalismo que caminha para a extinção, perda linguística irreparável para a cultura nordestina (#salvempainhoemainha). Pelo menos nome próprio continua sem precedência de artigo, quem é besta continua sendo “leso” e “oxe” ainda é a interjeição-rainha.

No plano arquitetônico/decorativo, toda varanda vazia me traz um sentimento de incompletude se não tiver uma rede tomando conta do pedaço. E sempre que isso acontece sugiro ao proprietário: “Ei, uma rede aqui, hein? Seria massa!”.

Enquanto as escolas de samba desfilam na rede plim-plim, preparo-me para viajar ao estado-irmão-mais-velho-pentelho, Pernambuco, para enfrentar o seu carnaval. Só para no final da festança dizer que nunca mais vou a Olinda – porque é caótico demais, porque não quero mais fazer xixi na rua – e falar que só vou para show no Recife Antigo, e no ano seguinte, como a dor do parto esquecida, repetir o mesmo erro, pois é dessas experiências ruins que trazem lembranças boas. Também é o momento para pegar inspiração na moda hipster feminina recifense, que deveria ser tendência em Milão e Paris a qualquer momento.

Xilogravura de J. Borges - Festa de Noca.
Xilogravura de J. Borges – A festa na casa de Noca.

Para não dizer que estou dando muita moral ao vizinho, defenderei até o fim a superioridade do São João de Campina Grande frente ao caruaruense – mesmo que faça mil anos que eu não pise sequer no Parque do Povo, pois tenho que manter a rivalidade tradicional.

Pois é, Paraíba, estou indo embora, mas as paraibagens nunca sairão de mim, no sentido mais carinhoso do termo – obs: vedado o uso por cariocas. Painho e mainha, aguardarei visitas. E levem um isopor com queijo de coalho, porque se lá tiver, não deve prestar.

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mariana-nobrega

Mariana é doutoranda em ciências criminais e mestra em ciências jurídicas. Pesquisa sobre direitos humanos, teorias feministas e criminologia. Também é servidora pública e mais uma advogada de araque neste país de direitoloides.

Habitudes

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2 comentários

  1. Massa Mariana! Painho e Mainha estao salvos… Mas olha, sotaques sao contagiosos. Dê tempo e convivio que os artigos comecam a aparecer na frente dos nomes proprios… Simplesmente aparecem.

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